domingo, 14 de janeiro de 2007

Conto: Hipnótica


Hipnótica
A Casa do meu sonho
NiceiaK



Desta vez, disposta a visitar em lembranças aquela antiga casa, conservei os olhos fechados, e pela mente desfilaram lembranças de ternura e mistério, que sempre povoaram minhas recordações.
Eu tinha cerca de oito anos e todos os dias de manhã, quando ia para o Grupo Escolar, dedicava alguns minutos observando aquela casa. Algo me prendia alí, diante daquela casa que me hipnotizava.
A casa , toda branca, tinha um beiral de gesso trabalhado. Havia uma pequena varanda que dava para o jardim da frente e a porta de madeira pesada, em duas folhas, entreaberta, possibilitava que eu tivesse ligeira idéia de como seria seu interior.
Por este vão, eu avistava a sala, revestida por um papel de parede decorado com florzinhas miúdas, azulado.Uma cortina branca ,transparente, deixava o sol da manhã entrar naquele ambiente, causando uma sensaçao etérea, leve, divina .
Não parecia habitada. Nunca vi nenhum de seus moradores, e este fato só aumentava minha curiosidade.
Quem moraria ali? um jovem casal sem filhos? Um velho sozinho em sua cadeira de rodas? Quem?
E meu olhar alcançava o telhado com telhas de cerâmica já desbotado e manchado de fungos onde cresciam pequenas plantinhas de sememtes deixadas pelas andorinhas.
O pequeno jardim parecia descuidado e as roseiras cresciam rebeldes e floridas.Havia um coqueiro, muitos arbustos e um pequena fonte com um anjinho, tocando harpa.
Agora com 25 anos de idade, morando em outra cidade, já formada, esta lembrança insistia a voltar a meus pensamentos.
Tomei uma decisao:
- Vou até a pequena cidade, visitarei minha tia e irei aquela rua ver se aquela casa ainda existe, tenho necessidade de viver esta emoção.
Enquanto dirigia pela estrada vicinal, fui observando a paisagem. Era início de Setembro, os ipês amarelos já exibiam sua efêmera florada.
Estava quente e no horizonte podia ver pequenas nuvens que prometiam uma chuva passageira.
Liguei o rádio ouvindo músicas sertanejas da rádio local e entre bois e boiadas, avistei a pequena cidade, que parecia perdida no tempo..
As alamedas arborizadas, as lajotas de concreto, revestindo as ruas, o mesmo encantamento.
Já caia a a tarde quando chego à casa de minha tia, que me recebeu com muitos beijos e abraços e com a mesa já posta com café, bolo,pão, leite , manteiga.
Naquela tarde não fiz mais nada, a não ser colocar a conversa em dia.
No dia seguinte, seria o grande dia, iria finalmente encarar aquela misteriosa casa e minhas recordações .
Não disse nada a ninguém, e fui a pé, sozinha, andar pela cidade, como fazia, quando era criança.
Pronto, ali estava eu naquela rua em frente àquela casa, após 17 anos.
Agora a casa estava pintada num tom de rosa antigo. Os beirais pintados de branco davam a sensação de casa renovada, contrariando minhas expectativas.
A casa não fora abandonda, ao contrário, até passou por uma reforma e com olhar muito mais apurado, pude notar os parapeitos e degraus em mármore branco e o piso da varanda em ladrilho hidráulico em gracioso arabesco.
O jardim estava florido e a pequena fonte, jorrava.
Sinal de vida, pensei tomada por uma felicidade inexplicável.
Após alguns minutos observando a casa , repassando minhas lembranças e revivendo minhas emoções, percebo alguém abrindo a porta principal.
Prendo minha respiraçao, me afasto, afinal o que poderiam pensar de uma intrusa em frente daquela casa.A porta se abre, totalmente e sai de lá um rapazote loirinho, lindo e me pergunta:-
O que você deseja?
Eu transtornada , pelo inesperado, e olhando aquele rosto delicado e irônico , ousei responder:--Eu quero conhecer tua casa por dentro.
-Então a senhora é a corretora?Num pensamento rápido concluí que a casa estava a venda.-
SIm, não, isto é, estou interessada na compra do imóvel.
Dias depois, conheço toda a estória da casa e torno-me a nova proprietária
Naquela época, quando era criança, morava ali um caseiro, pois o dono um fazendeiro, chamado Sebastião Arantes, seu Tião, aborrecido e desanimado com os governos brasileiros, mudara-se para Austrália, e naquele país, tornara-se o "Rei do Gado " e aquele jovem que me atendeu, era seu neto.
Penso que aquele hipnotismo pela casa, era a revelação do meu futuro.
Há 20 anos , quem passa à sua frente pode ler a elegante placa em vidro temperado "Cirurgiã Dentista"
niceiaK

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